Mario Cesariny foi de viagem
Estação
Esperar ou vir esperar querer ou vir querer-te
vou perdendo a noção desta subtileza.
Aqui chegado até eu venho ver se me apareço
e o fato com que virei preocupa-me, pois chove miudinho
Muita vez vim esperar-te e não houve chegada
De outras, esperei-me eu e não apareci
embora bem procurado entre os mais que passavam.
Se algum de nós vier hoje é já bastante
como comboio e como subtileza
Que dê o nome e espere. Talvez apareça
Esperar ou vir esperar querer ou vir querer-te
vou perdendo a noção desta subtileza.
Aqui chegado até eu venho ver se me apareço
e o fato com que virei preocupa-me, pois chove miudinho
Muita vez vim esperar-te e não houve chegada
De outras, esperei-me eu e não apareci
embora bem procurado entre os mais que passavam.
Se algum de nós vier hoje é já bastante
como comboio e como subtileza
Que dê o nome e espere. Talvez apareça
Mario Cesariny
Apareceram os dois.
Ele chegou, ela já tinha chegado.
Ele foi espera-la, ela já estava à espera dele.
O altifalante dizia que o comboio iria chegar à hora certa.
Eles dois chegaram mais cedo.
Para se conhecerem.
Sentaram-se num banco da estação.
Ele e ela, finalmente encontrados, esperando o comboio
Falaram da vida, contaram histórias, riram e choraram, disseram poemas,
lembraram os desencontros, ansiaram a viagem.
Ele e a morte.
Ele disse que se sentia cansado.
Ela segurou-lhe a mão.
Ela olhou para o relógio da estação e disse que estava quase na hora.
Ele respirou fundo e encostou a cabeça no ombro dela.
Sossegou.
Ela tinha um cheiro doce.
E o calor da mão dela sobre a sua sabia-lhe bem.
O comboio chegou silencioso.
O comboio chegou vazio.
Ela levantou-se estendeu-lhe a mão e ajudou-o a subir as escadas.
O grande relógio da estação marcava a hora certa.
Hora de partir.
Ela disse: Vem!
Ele respondeu: Vou!
Sentaram-se num banco de dois lugares.
Ele chegou, ela já tinha chegado.
Ele foi espera-la, ela já estava à espera dele.
O altifalante dizia que o comboio iria chegar à hora certa.
Eles dois chegaram mais cedo.
Para se conhecerem.
Sentaram-se num banco da estação.
Ele e ela, finalmente encontrados, esperando o comboio
Falaram da vida, contaram histórias, riram e choraram, disseram poemas,
lembraram os desencontros, ansiaram a viagem.
Ele e a morte.
Ele disse que se sentia cansado.
Ela segurou-lhe a mão.
Ela olhou para o relógio da estação e disse que estava quase na hora.
Ele respirou fundo e encostou a cabeça no ombro dela.
Sossegou.
Ela tinha um cheiro doce.
E o calor da mão dela sobre a sua sabia-lhe bem.
O comboio chegou silencioso.
O comboio chegou vazio.
Ela levantou-se estendeu-lhe a mão e ajudou-o a subir as escadas.
O grande relógio da estação marcava a hora certa.
Hora de partir.
Ela disse: Vem!
Ele respondeu: Vou!
Sentaram-se num banco de dois lugares.
O único banco do comboio.
Sentaram-se bem juntinhos
Ele acendeu um cigarro.
Ela olhou-o e sorriu.
Não era agora que ia começar a seguir as regras não achas? – Perguntou ele afirmando.
Ela sorriu de novo.
Ele sorriu também.
O comboio ia partir.
A viagem ia começar.
Ela olhou-o e sorriu.
Não era agora que ia começar a seguir as regras não achas? – Perguntou ele afirmando.
Ela sorriu de novo.
Ele sorriu também.
O comboio ia partir.
A viagem ia começar.
Uma nova viagem.
Mário Cesariny partiu de mão dada com a morte.
Mário Cesariny partiu de mão dada com a morte.
Juntos.
Partiram sorrindo.
Partiram sorrindo.
Na estação ficou o silêncio.
O relógio continuou marcando as horas.
Cada tic-tac uma lágrima nossa.
Pena de nós que ficamos com um pouco menos dele.
Uma lágrima e um sorriso
Um sorriso de amor ao homem poeta
ao poeta homem
( Mário apanho uma beata do chão e enquanto me curvo, penso em ti)
Um sorriso de amor ao homem poeta
ao poeta homem
( Mário apanho uma beata do chão e enquanto me curvo, penso em ti)
Isabel
"O separador"
Mario Cesariny
36 Comments:
Um poema da espera que é um poema da procura!
Linda a tua evocação de Cesariny!
Mas ficará na memória de todos nós!
Bjos
C.
Olá menina...
"A poesia foi um fogo muito grande que ardeu.
Depois ficaram as cinzas.
Náo sou capaz de dizer versos porque sim.
Acabou."
Até outro instante...
Kiss, boa semana para ti!
Foi-se o homem, fica o génio e a obra. Imortal.
Beijinhos
foi...
fica...
_______________________
O Mário vai ser sempre um dos melhores, um dos grandes, pelo menos para mim. É um dos meus heróis e admiro quem o admira.
Admiro-te por isso.
:)
Poesia, Amor, Liberdade.
Obrigado, Isabel.
Já tenho um texto para publicar em "A Voz do Povo".
Obrigado.
Até sempre, Mário Cesariny, jamais deixarás de estar nos nossos corações.
Homenagem merecida e boa escolha de poemas.
Não sei se viste, mas também no meu outro blogue ("Enquanto e não") o post de hoje foi dedicado ao Mário Cesariny
abr
Isabel.. que bonita homenagem (não gosto muito desta palavra... ) a este grande senhor das linhas e do pincel.
A estação continua.
A linha também.
A sua cor vibra.
Assim como a sua voz nas entrelinhas.
Um abraço enorme para ti e para ele.
Uma vénia sentida a esse grande poeta do nosso Portugal.
Uma enorme perda, sem dúvida. Mas a obra fica.
Bonito texto, o teu! **
Querida Isabel
O poeta (Cesariny) estará sempre vivo - na tua voz – na minha voz – na voz de todos os poetas
“voz numa pedra”
Não adoro o passado
não sou três vezes mestre
não combinei nada com as furnas
não é para isso que eu cá ando
decerto vi Osíris porém chamava-se ele nessa altura Luiz
decerto fui com Isis mas disse-lhe eu que me chamava João
nenhuma nenhuma palavra está completa
nem mesmo em alemão que as tem tão grandes
assim também eu nunca te direi o que sei
a não ser pelo arco em flecha negro e azul do vento
Não digo como o outro: sei que não sei nada
sei muito bem que soube sempre umas coisas
que isso pesa
que lanço os turbilhões e vejo o arco íris
acreditando ser ele o agente supremo
do coração do mundo
vaso de liberdade expurgada do menstruo
rosa viva diante dos nossos olhos
Ainda longe longe essa cidade futura
onde «a poesia não mais ritmará a acção
porque caminhará adiante dela»
Os pregadores de morte vão acabar?
Os segadores do amor vão acabar?
A tortura dos olhos vai acabar?
Passa-me então aquele canivete
porque há imenso que começar a podar
passa não me olhas como se olha um bruxo
detentor do milagre da verdade
a machadada e o propósito de não sacrificar-se não construirão ao sol coisa nenhuma
nada está escrito afinal
(Mário Cesariny)
Beijinhos
Com o pedido de desculpas à Iabel e ao
David Santos, deixo aqui um comentário que, de todo, me foi impossivel pôr no seu blogue., por o mesmonão oferecer a opção "ohter ou "anonymous":
____________
Lindo poema. Ao leitor dá a sensação de que, também ele, está ouvindo o pianinho do mar.
Era bem mais revolto o mar de umas férias que aí passei, na Torreira e na Barrinha de Esmoriz, nos princípios dos anos 50. Mas era belo, mesmo assim.
Obrigado pela sua visita ao meu "Enquanto e não"
Do silêncio imenso que se fez, passamos para a recordação de um homem bom, irreverente, sábio, artista. Foi belo lembrá-lo como o fizeste. Abç
As homenagens sucedem-se.
Os reencontros têm-se...relendo-o.
A eternidade de Cesariny é mesmo aqui muito pertinho, cá dentro de cada um de nós!
Até sempre!
Viveu muito e de forma produtiva. Poucos seres humanos, no final da vida, poderão dizer o mesmo. Phylos.
Olha,
fiz uma coisa não muito ecológica mas só assim consigo ler os teus posts com atenção: printei o teu blog, por enquanto este mês só! Agora tenho leitura suficiente. É assim: acho que escreves muito, mas mesmo muito bem, como já te disse, aliás!
Estava capaz de te pedir um texto um dia destes para partilharmos um pouco os blogues, mas depois falamos melhor.
Beijokas! Continua! Depois de ler os prints com atenção faço um apanhado sobre a tua escrita... Beijokas
Minha ignorância..me sinto um, ó maria vai com os outros..Mas, soube-me o que li..
intruso
Foi sim soprado um bj para ele...
:)
E aqui lhe fiz a homenagem!
http://poemasintemporais.blogspot.com/
Concordo e discordo.
Verdade é que tantos mas tantos não foram amados em vida e começaram a sê-lo depois de mortos.
É hipócrita é mesquinho é acima de tudo triste.
Mas somos livres até de ser mesquinhos, infelizmente faz parte do conceito de liberdade ser livre para tudo até para valorizar apenas os mortos.
Acredito, quero acreditar, que não é o caso daqueles de nós, aqui por este universo bloguista que quisemos apenas dizer-lhe adeus.
Como dizemos adeus a um amigo que foi de viagem.
Eu amei Mário Cesariny em vida, e depois de morto não o vou esquecer.
Vou continuar a ama-lo através do que escreveu do que pintou e recordando o grande homem que foi.
Amiga Josefa, há por isso que ter cuidado com as generalizações.
Lá por vivermos numa ditadura da maioria isso não nos torna todos iguais.
A morte é tão natural como o nascimento por isso o que se fez por esses blogs fora foi tambem uma festa para alguem que morreu, simplesmente, chegada a sua hora depois de muito ter vivido e muita dessa vivência deixou-a para nós sob a forma de poesia ou pintura.
Morreu e muitos de nós quisemos dizer-lhe adeus à nossa forma própria.
Não é hipocrita, porque o amamos em vida.
Eu raras vezes respondo aos comentários mas desta vez achei importante.
O sentido critico é bom e necessário mas por favor cuidado com as generalizações, muitos o amaram em vida e a Josefa sabe disso.
Até breve.
Isabel
Ele não morreu. Vai continuar em todos os que amam a sua Poesia.
Para mim, ele vai continuar aqui, nos seus livros que retenho na minha secretária, que releio em momentos de solidão.
Não, para mim ele não morreu.
Vive nos seus versos, nos seus livros...
UM abraço carinhoso
Otília
"A realidade, comovida, agradece
mas fica no mesmo sítio
(daqui ninguém me tira)
chamado paisagem
Tantos escritores
A realidade, comovida, agradece
e continua a fazer o seu frio
sobre bairros inteiros na cidade
e algures
Tantos mortos no rio
A realidade, comovida, agradece
porque sabe que foi por ela o sacrifício
mas não agradece muito
Ela sabe que os pintores
os escritores
e quem morre
não gostam da realidade
querem-na para um bocado
não se lhe chegam muito pode sufocar
Só o velho moinho do acordeon da esquina
rodado a manivela de trabuqueta
sem mesura sem fim e sem vontade
dá voltas à solidão da realidade.
Titânia e a cidade queimada"
"Mario Cesariny in Tantos pintores..."
Para mim o Poeta não morreu...
Deixo um abraço
uns morrem outros nascem,alguns desistem outros são eternos...
um abraço vagabundo cesariny...
um beijo vagabundo isabel
Isabel, foi com grande satisfação que encontro este post, pois publiquei um semelhante no meu blog, sem fazer a menor ideia que através de um blog e um post com comentários muito duvidosos me permitiria cá chegar.
O melhor dos comentários que vi naquele blog já o vi aqui também publicado. Gostei muito. Não preciso dizer mais nada.
Desculpa a extensão do comentário.
Abraço!
Apesar de não ser dos meus preferidos.
Uma enorme vénia para este poeta que se foi mas que não nos deixará jamais.
Bjos daqui
Eugénio
Nunca fui apreciadora de Mário Cesariny, mas deixo aqui os meus respeitos.
Um beijinho para Ti Isabel
olá Isabel!
Linda e enternecedora homenagem. Foi um homem que sempre admirei, pela forma como se agarrou, debateu, honerou tudo aquilo em que acreditava.Encetou apenas mais cedo que nós...essa viagem...
Bjs.
Lindo, lindo, lindo e deveras arrepiante...
Fica aqui a minha lembraça de Mário Cesariny:
"Lembra-te
que todos os momentos
que nos coroaram
todas as estradas
radiosas que abrimos
irão achando sem fim
seu ansioso lugar
seu botão de florir
o horizonte
e que dessa procura
extenuante e precisa
não teremos sinal
senão o de saber
que irá por onde fomos
um para o outro
vividos"
Beijos
chegaram as estações...Talvez nada mudou, mas é certo que a espera ficará nas lembranças.
Salve!!!Muito belo!
Abraços!
A sua alma e os seus feitos permanecarão sempre em nós!
Linda homenagem!
Beijinhos!
Desconhendo eu a razão, vejo-me forçado a comentar o teu "Gaivotas" neste espaço dedicado ao Mário.
Assim de imediato, lembraste-me a leitura de "Fernão Capelo Gaivota" de Richard Bach, livro pelo qual me apaixonei, permitindo-me conhecer também um grande autor.
Lembraste-me ainda o Tejo e a mesma visão que tiveste quando pequenina... as gaivotas em frenesim por pedaços de pão lançados pelas mãos de gentes que considerava eu - tão velhas como o próprio rio.
Lembraste-me ainda uma frase que tive para com a minha querida avó, na sua horta, também eu ainda com pouca capacidade para articular o idioma... "ó vó, as putas das "gaínhas" não põem ovos", o que a deixou naturalmente algo confusa entre uma repreensão ou um riso espontâneo.
Já viste bem no que nos tornámos, Isabel... convencidos que... como as gaivotas, também nós voamos!
Cara Isabel,
Não vou escrever sobre o Cesariny, porque já muito foi dito e eu próprio lhe prestei homenagem - a que ele merecia como poeta, pouco me importando o que ele foi como homem - no meu outro blogue, o "enquantoenao".
Venho aqui porque é um espaço dsiponível para agradecer a visita que me fez e o comentário gentílíssimo que me deixou e que imensamente apreciei, sobretudo por vir de uma pessoa que escreve tão bem e com tanta sensiblidade. Muito obrigado. E a sua história? quando aparece o 4º capítulo? Fico à espera
um beijinho
António
Então Isabel, Que sumiço levaste? desististe de blogar?
Estou com saudades
bjs
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