terça-feira, setembro 12, 2006

Brinde à loucura

Princesa das borboletas
Tchim, tchim
batam as taças
Tchim tchim
taça com taça
do melhor cristal
tchim tchim
que jorre o champagne
do melhor champagne
brindem comigo
hoje
pedi
exigi
bati com os pés
fiz birra
e
voilá
tenho umas asas novas
lindas
brilhantes
coloridas
vinham numa caixa de veludo
forrada a cetim
com uma alça de cordão
cheia de fitas coloridas nas pontas
na tampa, um bordado
para: a princesa das borboletas
tirei as asas da caixa
pareciam não ter nada
nada
eram feias de vazias
era uma beleza sem beleza
um brilho que não brilhava
umas cores sem porra de cor nenhuma
nada
eram asas mortas
Mas eram para mim
Tinha-as pedido
por isso com cuidado
muito cuidado
devagarinho
coloquei-as no sitio
com precisão
concentrei-me
nos ajustes
no encaixe perfeito
eu e as minhas asas
num encaixe perfeito
com muita concentração
Fiz o download
das asas antigas
todos estes detalhes
saõ essenciais
são essência
sem essência
as asas
ornamentam
mas não vooam
esperei
esperei
depois lentamente
suavemente
agitei-as
e
éna,
como elas ganharam cor
e brilho e movimento
e soltaram luz
num brilho quase incandescente
loucas
voaram
loucas
rodopiaram
dançaram
loucas
aos ziguezagues
loucas loucas
são
as minhas asas novas
que bela estou
linda
tenho asas nos olhos
asas no corpo
asas nos meus movimentos
de bailarina borboleta
tenho em mim
asas
e as minhas asas
são cheias de mim
eu e as minhas asas
novas
temos
o brilho
da loucura
loucas!
vamos brindar
brindem comigo
vamos voar
voem comigo
hoje sou
a princesa das borboletas
Isabel (Princesa das borboletas)
"Queen of the butterflies"
Dali
Reconhecimento à loucura
Já alguém sentiu a loucura
vestir de repente o nosso corpo?
Já.
E tomar a forma dos objectos?
Sim.
E acender relâmpagos no pensamento?
Também.
E às vezes parecer ser o fim?
Exactamente.
Como o cavalo do soneto de Ângelo de Lima?
Tal e qual.
E depois mostrar-nos o que há-de vir
muito melhor do que está?
E dar-nos a cheirar uma cor
que nos faz seguir viagem
sem paragem
nem resignação?
E sentirmo-nos empurrados pelos rins
na aula de descer abismos
e fazer dos abismos descidas de recreio
e covas de encher novidade?
E de uns fazer gigantes
e de outros alienados?
E fazer frente ao impossível
atrevidamente
e ganhar-Ihe, e ganhar-Ihe
a ponto do impossível ficar possível?
E quando tudo parece perfeito
poder-se ir ainda mais além?
E isto de desencantar vidas
aos que julgam que a vida é só uma?
E isto de haver sempre ainda mais uma maneira pra tudo?
Tu Só, loucura, és capaz de transformar
o mundo tantas vezes quantas sejam as necessárias para olhos individuais
Só tu és capaz de fazer que tenham razão
tantas razões que hão-de viver juntas.
Tudo, excepto tu, é rotina peganhenta.
Só tu tens asas para dar
a quem tas vier buscar
José de Almada Negreiros

/Desconheço o autor desta fantástica fotografia/

2 Comments:

Blogger alice said...

querida isabel,

este post é um download de um par de asas ;)

muito obrigada pelo poema que me deixou no blog, adoro o botto!

fui buscar ao arquivo do meu blog um texto para brindar consigo

"caminhava sem pressa por àquela hora lhe ser mais fácil não ter para onde ir. a seu lado o amor, denso, curvado, manco. à sua frente a morte, alta, esbelta, provocante. usava uma noite larga, comprida e branca. no corpo, os cigarros e outros embaraços para disfarçar más línguas. quando nasceu de cesariana, houve negligência no trato do feto por aborto de incoerência. mais tarde, quando suspeitaram da configuração dos olhos e lhe pesquisaram os genes, já as traças tinham roído a cura no armário. procuraram na fé e nas bruxas, mas não há ciência para a escuridão. e no dia do baptizado foi com água pouco benta que lhe chamaram loucura."

um grande beijinho para si,

alice

quarta-feira, setembro 13, 2006  
Blogger A said...

Ainda ontem falava de loucura com uma grande amiga minha... também ela anda por estas paragens, mas as nossas vidas que já contam dez anos de amizade conjunta vestiram-se de outros tecidos bem mais reais...

e ela dizia-me que sente o hálito da Loucura a roçar-lhe o rosto...


não sentimos todos?....

O tempo é sempre um aliado.

Beijinhos Isabel - a princesa das Borboletas

quarta-feira, setembro 13, 2006  

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