quinta-feira, outubro 12, 2006

Canto às asas

Nada
nasci sem nada
sem nada
morrerei
nada trago comigo
nada levo
nada deixo
nos mundos por onde passo.

nada tenho
nada é meu
nem o mar
nem o céu
nem as arvores
nem os pássaros
nem o amor
nem a amizade
nem a dor
nem a felicidade
nada é meu
nem eu.

minhas
apenas
as asas

com elas
viajo por todos os mundos
com elas
escrevo todos os livros
com elas
amo todos os amores
com elas
voo todos os voos

minhas
apenas
elas
as asas

nada tenho
nada é meu
nem os olhos
nem a boca
nem a pele
nem as folhas
nem o papel
nem o leite
nem o mel
nem o enfeite
nem o fel
nada é meu
nem eu

minhas
apenas
estas
asas

quando
partir
para o descanso final
irei voando
eu
e as minhas asas
leve
despojada
de corpo
continuarei
só alma
e asas
voando
novos céus
que também não
serão meus

minhas
só as asas
com elas voltarei
sempre
voando
para ti

serei corpo
serei alma
nada
apenas
asas

sou asas
e voo


Isabel




"O voo"

Marc Chagall

18 Comments:

Anonymous Anónimo said...

muito bonito
o teu voo
e o de chagall
"minhas
só as asas
com elas voltarei
sempre
voando
para ti"
fáz isso...
depressa...
beijos grandes

quinta-feira, outubro 12, 2006  
Blogger veritas said...

Este comentário foi removido por um gestor do blogue.

quinta-feira, outubro 12, 2006  
Blogger veritas said...

Olá Isabel!

Sim. E porquê? Porque há, efectivamente, algo que nunca nos podem tirar, porque não é matéria...

quinta-feira, outubro 12, 2006  
Blogger Embryotic SouL said...

Pois! Depois eu é que sou escritor (modesta...rsrsrs).
Não só da matéria vivemos...e não só de matéria somos...tudo o que já sentimos é nosso, e isso, ninguém nos pode roubar.

Escreves com o lápis de um poeta.
Um sopro sentido

quinta-feira, outubro 12, 2006  
Blogger Alberto Oliveira said...

Quem dera ter umas asas
p´ra um dia poder voar
voar por cima das casas
com gentes a lá morar.

Com gentes a lá morar
a vir verem-me à janela
"como ele gosta de voar!"
dizia ele para ela.

Dizia ele para ela
e beijava-a com ardor
entretinham-se à janela
a ver voar o amor.


Alberto/Legível

Boa noite!

quinta-feira, outubro 12, 2006  
Blogger £ou¢o Ðe £Î§ßoa said...

Sem nada e no entanto com tanto...

Kiss, até outro instante!

quinta-feira, outubro 12, 2006  
Blogger Delfim Peixoto said...

Isabel.... comoveste-me com a tua sensibilidade...afinal sou humano, né?
Belo!
bjs ternos

quinta-feira, outubro 12, 2006  
Blogger Teresa Durães said...

líndissima a pintura de Chagall que não conhecia

muito bonita a tua expressão. penso como tu. somos poucos a pensar deste modo. é pena.

boa noite!

quinta-feira, outubro 12, 2006  
Blogger MEU DOCE AMOR said...

Gostei Não fales de morte.Ainda és muito nova...para falares assim.
Vive a vida e canta-a.
Bj d
d :(

sexta-feira, outubro 13, 2006  
Blogger Estranha pessoa esta said...

Fiz um intervalo[zeco] da dita greve e vim aqui sentir a brisa das tuas palavras...

..
:) :) :)


Voa Sempre..
Seja para onde for.
Seja no que for.
Seja o que esse for seja
Mas, voa!

Um abraço desassossegado para ti **

sexta-feira, outubro 13, 2006  
Anonymous Anónimo said...

Passei para ver esta agradável e sempre interessante página, onde me delicio nesta madrugada, e também para desejar bom fim-de-semana. Muito bonito.

sexta-feira, outubro 13, 2006  
Blogger P. Guerreiro said...

"Não tenho ambições nem desejos.
Ser poeta não é uma ambição minha.
É aminha maneira de estar sózinho"

Alberto Caeiro

Também sem asas se consegue voar...

Um abraço e bom fim de semana!

sexta-feira, outubro 13, 2006  
Blogger vida de vidro said...

Nada é nosso, na verdade. Mas ter asas é ser privilegiada. Tens muito, afinal! **

sexta-feira, outubro 13, 2006  
Anonymous Anónimo said...

Realmente não temos nada, e alguns nem asas têm.

sexta-feira, outubro 13, 2006  
Blogger Vanda said...

Bom dia miuda marinheira! :)

E que alegria é voar e não precisar de ter qualquer mundo como nosso, para pousar!

Adorei o teu poema!

Aprendi a palavra desapego há ainda poucos anos :) vivi formatada numa outra versão durante bastantes anos, onde era habitual eu sentir com orgulho "a minha casa" "as minhas flores" e por aí adiante...

Descobri depois que as casas se podem transformar em prisões e que flores, as há, felizmente aos montes, por esse mundo fora e só para nos darem alegrias! :)

Descobri lentamente a palavra desapego por dentro :) e isso foi a minha grande libertação :) ainda eu não tinha lido nada sobre budismo e já punha em prática as lições :)

Julgo que me desfiz de tudo e estava de mochila pronta para a travessia do mundo, quando tropecei no meu gajo...e voltei a precisar de tudo :) mas sabes? agora já não uso a palavra "minha" antes da palavra casa :) já aprendi que a casa é apenas o sitio onde estou de passagem :) e que nunca se sabe, se volta a ser prisão :)

Por isso voemos livremente, sem nada nosso a não ser o sonho de pousarmos todas as noites em quem nos ama e nós amamos :)

O resto é apenas paisagem!

:)

Beijos e bons vôos!

Van

sexta-feira, outubro 13, 2006  
Blogger Vida said...

A melhor descrição que li até hoje da liberdade... como deve ser bom ser dono só das nossas asas e voar... Lindo este texto.

Beijos e bom fim de semana.

sexta-feira, outubro 13, 2006  
Blogger Aldina Duarte said...

As asas que esperamos ver crescerem no regresso à eternidade serão a sombra viva duma morte descansada na terra paciente e elucidada sobre tudo oq ue é existência!

Até sempre!

sexta-feira, outubro 13, 2006  
Blogger Pierrot said...

"Voa... e um dia nos encontraremos no meio de alguns desses céus numa festa que não poderá terminar"...R.Bach
Perfeito.
Bjos daqui
Eugénio

sexta-feira, outubro 13, 2006  

Enviar um comentário

<< Home