quinta-feira, maio 31, 2007

Dia B

31 de Maio.

Hoje é o dia da minha B.


Hoje um dia já bonito passou a ser um dos dias mais bonitos de todos os dias bonitos.
Chamo-lhe minha B porque dizê-lo assim a pensar é meu pensamento musicar.
Chamo-lhe minha porque chamar-lhe assim é abraça-la com palavras.
Chamo-lhe minha B porque a B como eu a vejo é só minha.

Mas não é minha a minha B.
Ninguém é de ninguém e a B é do mundo inteiro.
O mundo fica embevecido por sabê-la parte dele.
E eu fico embevecida por sabê-la parte deste mundo meu.


A minha B é parte do mundo mas não sei como lá cabe ela e todos nós.
O mundo que a minha B tem dentro dela é maior que o mundo que tem a B dentro dele.
Não sei como é possível e o próprio mundo não me sabe explicar.
Responde-me apenas que a minha B é AMOR e para AMAR.

Hoje é dia da minha B

e eu nada tenho para lhe dar.
Nada.
Nada tenho que seja meu
nada a não ser eu.
E eu, que presente sou eu
se e a mim já ela me tem.

Não tenho mesmo nada,
Não tenho nada meu
a não ser eu.
mas se este eu for para ela alguma coisa
o que eu tenho de meu é também seu

Hoje é dia da minha B

E nunca lhe vi os olhos
sei que estão cheios de céu, de pássaros, de brisas e ventania.
sei que estão cheios de mares e marés de peixes, algas sereias e marinheiros
sei que até de faróis eles estão cheios
sei que têm jardins cheios de todas as flores, de todas as cores, de árvores de todos frutos de todos os sabores, de abelhas, libelinhas e borboletas, joaninhas, gafanhotos lesmas, lagartos e caracóis
sei até que há lá um tronco há muito adormecido
para o olhar se sentar e também poder descansar


Hoje é dia da minha B

E nunca lhe escutei a voz
mas o seu canto embala-me os sonhos e os pesadelos
sossega-me com seu doce tom
a raiva e a revolta às voltas e reviravoltas
neste mar zangado que há em mim

e quando a falta de ar quase me mata
e me sente asfixiar
põe-se ao meu lado
e grita comigo
acompanha-me no gritar

Hoje é dia da minha B

Nunca lhe senti as mãos
sei que são quentes
sem lhes tocar
nunca precisámos do toque
para dar as mãos
e novos mundos caminhar

Nunca lhe senti as mãos
mas além de mim
que já me tem
quero as minhas mãos lhe dar

Parabéns minha B

Isabel

Este texto é para a minha grande amiga Bettips, http://bettips.blogspot.com/, que faz hoje anos.


alt=""id="BLOGGER_PHOTO_ID_5070754426122100290" />
Fotografia de Rui J. Santos

segunda-feira, maio 28, 2007

Ausente

Cada vez com menos disso a que chamam fé, distante de qualquer Deus, até do meu.
Ausente, hoje, de palavras minhas.
Ausente de mim até.
Estou longe. Na outra margem da outra margem.
Longe.
Ausente de mim evoco outras vozes.
Mais crédulas.
Ainda crentes num novo Deus.
Eu… eu…
Já não creio no novo sequer.
Muito menos em Deus.
Ausento-me.
Na outra margem da outra margem.
Mas não estou lá.
Nem sei onde é.

Evocação

Evocação
I
Não memorizo aldeias
Nem aldeões:
Meu cabelo ao vento
– lúcido, tardio –
Exibe o corte,
a ruptura
a outra margem;
A imagem destorcida em mim
Não é doce nem crédula:
Pus a vida acima da Era;
O corpo acima da cela;
Os pés acima do cavalo...
e, se assim não fosse,
aí sim, seria errado.

II
Mar. Terra. Cana. Terra-Seca:
Não é preciso ir muito,
para ser estranho...
Das entranhas do dia,nasço
– não se nasce do nada,
se surge do ambíguo.

Não tardo nem contento,contemplo;
E o chover não mais distrai
O piscar de olhos
– rebento do adeus
sem vestígios.

Ah, atordoar infantil!
Versos de outrora conjugados, lentos
Nada mudou...
ainda me sou,
rebentar violento.

III
Pernas acima da Terra.
Pó por cima de nós, dos sóis, dos séculos
(e não há outra ruptura
senão ser girassol!)
O cavalo segue abaixo, distante
Não é preciso estar acima, para estar melhor...
Não me abarco
E piso,
Como quem pisa um tapete, nuvens
Detendo nas mãos um telefone...
O que ferirá mais, senão a palavra?
Palavra dúbia.
Anti-prece.
Anti-deus.

IV
Contemplo. A chuva. O guarda-chuva. A náusea.
Nos olhos pardos, o passado pesa...
E há ferida: quanta dor inflama!
Quisera não ser eu, poeta ou passo;
Palácio erguido num confuso brio:
Meus sonhos são faces do céu que crio
Poemas ávidos, avós reversos......
e isso, ninguém sabe.

V
Na timidez, procuro-me só:
Assim sou no extenso vão da palavra!
Quisera ser morena, alva – viúva
Tudo menos poeta e colibri:

Pousar e ser única
– aldeã!
Talvez feliz.

VI
Campo, campina. Galo-de-Campina.
Há tanto, tantas lembranças mortas...
O verde sucumbiu aos olhos
Que, no chão, semeiam concreto.

Na outra margem,
lá, sempre lá,
Fico. Reservo. Esqueço...
Lanço ao rio o tonel
o túnel de meus anos.

Não hei de lembrar, como sempre.

VII
Padeço muito e lento,
muito lento.
Se chuvas, lágrimas, seres,
esvaem-se, algo fica...
Certas canções não sanam as lacunas do tempo;
Tempo-corpo, poema.

(Ah, se não fosse sopro, não fosse águia, cerveja...
se talvez flechas, não telefone...
se apenas mulher... não essa sina!)

VIII
Cruzar bares, mares, risos
E na outra margem
a palavra está...Cardíaca, a alma reclama
Seu desejo último– ávida, certa.

IX
Vivo;
Como isso não diz muito, adeus...
Sempre planícies por trás de serras
E rio entre montes; sigo.

Não responda o adeus
(nem a deus peço):
Sempre mais uma ponte e um riacho
E um cavalo para domar...

X
Só,
Mas há outra margem;
E, por ser ainda crédula,
Um novo deus

Virgínia Celeste Carvalho

"No meu centro"
Fotografia de Helena Isabel Ponce

terça-feira, maio 15, 2007

Começar de Novo

Ana da Força

O meu nome é Ana. Sobre mim escrevo eu.
Foi assim que comecei a minha participação neste livro.
Com a minha arrogância habitual.
Por esta altura, imagino que quem me leu já tenha passado por um misto de sentimentos a meu respeito.
São assim os leitores… a maioria, pelo menos!
Confusos, sensíveis, manobráveis e sempre prontos a desculparem tudo e todos… até as cabras como eu.
No início foi mesmo isso que me devem ter considerado: uma verdadeira cabra!
As verdadeiras cabras, suscitam sentimentos de ódio, de raiva, de paixão mas nunca de indiferença.
Uma cabra como deve de ser consegue sempre ser a mais interessante das personagens.
Não é por acaso que os actores têm preferência por serem os maus da fita, em vez dos bonzinhos e normalmente mais enjoativos e menos intrigantes.
As cabras, os malandros, os sacanas, os canalhas têm o dom de aguçar o lado mau que existe em todos nós e que raramente admitimos.
Frequentemente delicio-me a escutar por aí os comentários que se fazem a este tipo de personagens, e não posso deixar de sorrir.
Um sorriso carregado da minha arrogância habitual, de alguma ironia e de tristeza também.
Caso não saibam, nós as cabras, também temos momentos de tristeza.
Momentos até de extrema e penosa tristeza, no caso particular desta cabra que sou eu.
Ouço-os para aí opinar o quanto as ditas personagens são interessantes e polémicas.
Observo-os por aí dedicados à análise do desenvolvimento das suas personalidades, considerando-o sempre surpreendente, tudo isto, obviamente, não colocando nunca em causa a elevada e qualificada capacidade de analisar de que se julgam afortunados possuidores. Capacidades e qualificações indiscutivelmente merecidas dada a quantidade, essa sim verdadeiramente surpreendente, de novelas, filmes e livros de má qualidade que vão papando e querem continuar a papar clamando sempre por mais e mais e mais.
Manhosamente cobardolas é o que são, esquecem-se de admitir que é uma maneira confortavelmente cobarde de assistir, sentadinhos no sofá, a um pouco do mal que todos nós gostaríamos de fazer e para o qual não temos coragem.
É uma forma medíocre de serem também, um bocadinho mauzinhos sem se sentirem como tal, evitando assim a culpa e risco que os verdadeiros maus não deixam de correr.
Agrada-me que passem por esse misto de sentimentos ao ler-me… porque como boa cabra que sou tenho mais, muito mais, para vos dar.
Já perceberam que sofro de uma coisa a que os psiquiatras chamam múltipla personalidade.
A verdade é que a frase em si é já uma incoerência, como se pode dizer que se sofre de algo, se é esse algo que nos evita o sofrimento.
- Afinal a cabra é cobarde e também tem medo do sofrimento!
Estão vocês meus queridos, adoráveis, simpáticos e inteligentes leitores agora a pensar.
Agora sim, estão a ser o que realmente sempre vos considerei: mauzinhos, com a mania que são espertos e sempre, sempre prontos a vingarem-se das que consideram cabras como eu apontando-lhes o dedo.
Admitam, há um pouco de mim em cada um de vós.
Admitam!
Vão ver como se sentem, senão melhor, pelo menos um pouco mais corajosos, um nadinha menos cobardes.
Virem esse dedo que me apontam na vossa própria direcção.
Aí sim, estarão finalmente a ter alguma da porra da honestidade que apregoam por tudo quanto é sítio, sem que nunca o cansaço vos tome, sempre que a oportunidade vos surge.
Pois, caríssimos leitores, o que vos digo é que não sei.
Talvez até seja assim.
Um Chico esperto qualquer de um psiquiatra que vos explique.
Eu não morro de amores por eles, por isso poucas perguntas lhes faço.
Se não confio nas respostas para quê gastar perguntas?
Principalmente para quê gastar as palavras que amo em vez de as guardar para quem as beba comigo.
Para quem nelas se envenene comigo.
Para quem nelas se mate e renasça comigo.
Para quem nelas se enterre e com amor as foda comigo.
Para quem nelas se alimente comigo. Devorando-as ou saboreando-as, sôfrega ou delicadamente comigo.
Para quem nelas se esfregue violentamente comigo.
Para quem nelas se entregue em doces e ternas carícias comigo.
Caso não saibam, nós, as cabras, também amamos.
Eu sou uma cabra que ama as palavras.
A fulaninha que escreve este livro também as ama, foi por isso que concordou que fosse eu a escrever sobre mim, porque partilhamos este amor desmesurado pelas palavras.
Também partilhamos a vontade de não ter os psiquiatras, psicanalistas e afins por perto.
Eu quero-os longe de mim.
Quero-me o mais longe possível das suas elevadas e fundamentadas teorias.
Sei como chamam a esta coisa de que “sofro”, e chega!
Sei quando as Anas começaram a aparecer e vocês também sabem que já vos contei.
Tadinhos, não vos quis ver sofrer de tanta curiosidade.
Afinal a cabra até é boazinha quando quer e teve pena do coitado do leitor roendo-se de curiosidade!
Oh, abominável sentimento esse, a curiosidade!
As Anas, como sabem, apareceram quando um monstro doente, certamente também, em estado de insuportável sofrimento, entrou dentro de mim.
Carinhosamente chamou-me querida, enquanto à força, me penetrava com uma brutalidade que apenas consigo descrever como animalescamente monstruosa.
Força, é uma triste força de expressão, pois nem força o coitado do "animalzinho" doente teve de fazer.
Limitou-se a aliviar a dor da sua doença em mim.
Eu morri.
Morri, pronto!
Estava morta.
Morri afogada no vómito da minha alma.
Morri e nasci novamente.
Nasci de novo e surgi renascida pelo menos tão monstruosa e doente como o monstro doente.
Renasci com uma doença chamada múltipla personalidade, dizem os psiquiatras, psicanalistas e demais estudiosos da mente humana.
Só não sei o porquê das minhas personalidades terem todas o mesmo nome.
Nos filmes e nos livros que tenho visto e lido, cada uma tem um nome só para si.
As minhas não.
Que pobreza!
Nós somos todas Anas.
Talvez seja porque gostamos do nome.
Ou talvez seja devido à minha, já vossa conhecida, arrogância e maldade.
Sou tão má, tão má, que obriguei as minhas múltiplas personalidades a terem todas o meu nome. Sou mesmo cabra!
Nem um nome, só delas, as deixo ter.
Logo a elas a quem tanto devo!
Logo a elas a quem deveria estar tão grata!
Afinal, vieram, qual corajosas cavaleiras andantes, salvar a donzela cabra, em apuros do seu extremo sofrimento, da sua dor lancinante, e nem o direito a um nome lhes foi dado.
Pois é, meus caros leitores, gostava de vos garantir de que sou inteiramente culpada de mais essa maldade, da qual sem dúvida me orgulharia, mais que não fosse pela capacidade de controlar com esse requinte malévolo a doença de que sofro, mas a verdade, quer acreditem quer não, é que não sei o porquê das coitadas terem todas o mesmo nome.
E nem isso me preocupa por aí além, confesso!
Afinal Ana é um nome bonito e apesar de não terem um nome diferente tem a diferença nas personalidades, essas sim completamente distintas umas das outras.
Que maneira melhor de ser diferente?
Todas nós escrevemos. Não contamos informar-vos muitas vezes qual de nós está a escrever. Uma vez ou outra, talvez não vos seja fácil perceberem qual de nós está presente nestas palavras, por exemplo quando falamos no monstro doente quase sempre estamos muitas, mas nem sempre, hoje até agora estou só eu.
Eu sou a Ana da Força.
Sou a mais forte de todas as Anas.
Sou a que vem quando qualquer uma das outras começa a fraquejar.
A Ana que estava connosco hoje ao acordar, acordou frágil, muito, muito frágil.
Acordou ela e com ela acordaram mil fantasmas adormecidos.
Outra Ana tinha-os posto a dormir há já muito tempo mas a fragilidade daquele despertar despertou-os também.
Os fantasmas, como os micróbios, como as bactérias, como os fungos e como os amores tumores gostam da fragilidade e da insegurança.
Na fragilidade sentem-se em casa.
É aos terrenos frágeis, aos solos inseguros e pantanosos que gostam e podem chamar de "lar".
É lá que constroem habilmente as suas armadilhas, as mesmas armadilhas em que, por vezes, caímos e das quais nos tornamos eternos prisioneiros.
A Ana acordou assim, frágil insegura e rodeada de fantasmas bem despertos, prontos a atormentar-nos, dispostos a armadilhar disfarcada e habilidosamente o nosso chão.
O seu primeiro arrepio fez-me vir logo a correr.
Um simples arrepio é um sinal de SOS para mim.
Eu cheguei correndo, ela fugiu e eu fiquei.
Sou a Ana da Força.
Ana é o meu nome.
A Força é o que me distingue das outras Anas.
Desta vez tenho intenção de a usar para nos dar força para partir.
Partir para uma longa viagem que todas concordamos ser necessária.
Uma viagem que nos torne inteiras.
Uma viagem que nos torne vivas e independentes.
Umas viagem que nos faça de novo, crescer, florescer e renovar.
Recentemente li num livro um ditado japonês que diz:“ Na viagem companhia, na vida compaixão.”
Talvez a tal fulana que escreve este livro até concorde, ela é uma grande admiradora da cultura oriental.
Eu não concordo e acho quase todos os ditados, principalmente os da dita “cultura oriental”, bastante idiotas.
Companhia na viagem, porquê?
As viagens com sentido, com propósito, com um fim, fazem-se sós.
As viagens com sentido e com propósito não têm destino pré definido, ou caso tenham, acreditar que ele se cumpre é pura idiotice ou ingenuidade.
O destino vai-se encontrando e só caminhando sós, conhecendo cada pedra da estrada da solidão poderemos vislumbrar o destino de uma viagem.
Vislumbrar.
Vislumbrar, somente, porque conhecer apenas conhecemos o destino da nossa última viagem: a viagem com destino à morte.
Origem- Nascimento
Destino final- Morte
No meio, muitos são os, caminhos, as paragens, os vários pequenos destinos, todos, no fundo, uma ligação entre o nascimento e a morte.
Compaixão na vida?
Mais ridículo ainda.
Na vida, com/paixão, isso sim!
Na vida, com amor isso sim!
Na vida, com coragem, isso sim!
Na vida, com força, isso sim! Na vida, com luta, isso sim!
Na vida, com garra, isso sim!
Na vida, com raiva, isso sim!
Na vida, com tesão isso sim!
Na vida, com Vida, isso sim!
Na vida, com Vida a transbordar, isso sim!
Esta viagem, no entanto terá de ser feita com companhia.
Com a companhia da Luísa.
É uma viagem de vida.
Por isso tem de ser feita na companhia de quem nos mata.
Temos de nos libertar da Luísa.
Temos de nos despegar da Luísa.
Eu Ana, nós Anas, somos monstros doentes.
Mas eu Ana, nós Anas, não queremos continuar a ser monstros doentes e aberrações ainda dependentes deste maldito sentimento que nos engole nos mastiga, nos devora, mas sem o qual murcharíamos.
Eu Ana Força darei força às outras Anas para iniciar esta viagem.
Temos muito para decidir:
Quando partir?
Como enganar o idiota com quem a Ana se casou?
Como evitar que ele nos procure?
Como não deixar rasto?
Como passar despercebidas?
Como ir buscar a Luísa?
Terá ela força?
Saberei eu, Ana da Força dar-lha, caso ela não a tenha?
Entenderá aquela idiota que temos de nos separar para nos podermos abraçar de novo?
Onde está o teu abraço Luísa?
Onde está a tua mão quente sempre suada?
Onde esta essa voz tolinha que me dizia coisas mais tolinhas ainda e me fazia sorrir?
Onde estão os teus cabelos deitados no meu colo, roçando as minhas pernas enquanto enrolada em sofrimento choravas molhando de sal doce a minha pele?
Onde estão os teus dedinhos finos desenhando círculos nas minhas orelhas enquanto a tua boca me sussurrava segredos ao ouvido?
Onde estão esses teus olhos desesperados e sedentos de carinho pedindo sempre mais, dando sempre um tudo que eu achava sempre pouco?
Onde estão as tuas promessas que eu ridicularizava mas me enchiam de conforto?
Onde está a música das tuas palavras cantando para mim: “…nunca vou gostar de ninguém como gosto de ti Ana”.
Onde está a Ana da Força?
Onde está a Ana da Força?
Foi embora.
Foi embora com a lembrança da Luísa.
Agora estou aqui eu novamente. Frágil, fraca, pequenina…
Agora estou aqui eu, uma planta doente, um centro morto de saudade, rodeado de folhas ainda vivas que mais não são que braços abertos chamando por ti.
Isabel
(Continua)



"Luta"

Fotografia de Helena Isabel Ponce

Quero agradecer ao Nilson Barcelli do Nimbypolis, http://nimbypolis.blogspot.com/, por me ter nomeado como um dos blogs que o fazia pensar, vindo dele e sendo ele um dos meus nomeados " indutores de pensamento" não posso deixar de me sentir honrada. Quero também agradecer-lhe por me perguntar o porquê de eu não escrever hà uns tempos e isso o fazer preocupar-se com o estado de minha alma. É bom, tocante e estimulante receber essas pequenas/grandes atenções de quem nos conhece apenas através da escrita. O meu estado de alma está bem, embora muito atormentado com a falta de tempo para escrever e para ler ( ler inclui as visitas aos vossos espaços e as leituras interessantes que por lá encontro) . Lutarei com todas as minhas forças contra essa falta de tempo e sempre que sair vencedora dessa batalha aparecerá algo aqui escrito por mim e um sinal da minha presença nos vossos espaços.

quinta-feira, maio 03, 2007

NOVOS PENSAMENTOS


Fui, novamente, nomeada como um dos 5 blogs que fazem pensar.
Desta vez fui nomeada pela minha querida amiga Vida do Sentimentos,
http://sentimentosdiarios.blogspot.com/ e pela minha queridíssima Maria do Cheiro da Ilha, http://ocheirodailha.blogspot.com/ , duas mulheres lindas a quem não posso deixar de agradecer.

As coisas valem o que valem e uma nomeação vale pouco se for vista apenas assim: como um selo que colocamos no nosso espacinho e nos faz sentir orgulhosos de coisa nenhuma.

Mas…
Por detrás de uma nomeação há uma pessoa que nomeou.
Essa pessoa sim, tem valor para mim e muito!
Por detrás de uma nomeação há também o porquê da nomeação.
Neste caso o porquê é "Fazer pensar" e isso, sim, é importante.
Muito importante!

Eu escrevo para pessoas, as minhas personagens são pessoas com muito desta outra pessoa que sou eu.

Escrevo tentando com as minhas palavras tocar de todas as formas possíveis as pessoas para quem escrevo. Fazer pensar é uma das formas de tocar. De alcançar. De atingir.De partir daqui e chegar lá. Lá onde me lêem pensam e partem também levando algo de novo no pensamento.

Não posso, pois, deixar de estar orgulhosa de ter tocado duas das pessoas para quem escrevo.
Estas duas pessoas, a Maria e a Vida são duas mulheres maravilhosas, com personalidades bem marcadas, bem definidas, bem desenhadas, bem construídas e, no entanto, a sua inteligência, a sua sensibilidade, o seu sentido critico, a sua curiosidade, a sua forte vontade de ir mais longe, de tocar e de se sentiram tocadas, faz com que estejam particularmente atentas ao que as rodeia, faz com que busquem quer na diversidade quer na semelhança o permanente despertar do pensamento.

Admiro-as e gosto de pensar que já pensámos e continuaremos a pensar muito juntas.

Esta nomeação fez-me pensar na pessoa que desde criança mais me fez pensar:
O meu pai.

O meu pai, não apenas porque era meu pai, mas porque ele próprio ser pensante e pensador, era incapaz de pôr no mundo outro ser, fruto do seu ser, sem lhe tentar oferecer (porque de uma oferta se tratava) a mesma capacidade de pensar, o mesmo amor pelo pensamento e consequentemente o mesmo amor pela dúvida.
Duvidei de tudo e mais alguma coisa mas nunca duvidei do seu amor por mim nem do quão doloroso foi, para ele, vezes sem conta, obrigar-me a duvidar daquilo que sabia que eu tanto queria acreditar.
Mas por amor, apesar da tristeza que via nos meus olhos e da dor, que sei, sentia no coração, não deixou de me oferecer aquela que achou ser a maior herança que me podia deixar: a capacidade de pensar.
Obrigada pai, é um tesouro pesado, mas é um enorme tesouro.
Com o meu pai, nunca foi suficiente dizer, eu sou, eu quero, eu gosto, eu acredito, eu faço, eu penso.
Da boca do meu pai saltavam de imediato as perguntas, as interrogações, os porquês.
Em mim começavam a aparecer as dúvidas e a desaparecer as certezas.
Era mágico mas penoso.

Sou.
O que é ser?
És ou estás a caminho de ser?
Se és, és o quê?
Se estás a caminho de ser, o que te fez escolher?
Quando está um ser completo.
Quando pode alguém dizer que é alguma coisa.
O pouco que és, o que te fez ser assim?
Achas que já és suficiente?
Chega-te ser suficiente?
Quanto mais tens de caminhar na vida para poder dizer: eu sou?

Quero.
Queres?
O que é querer?
Querer, desejar ou ter vontade de algo, são a mesma coisa?
Tens a certeza do que queres?
Porque queres isto e não aquilo?
Até onde estás disposta a ir para conseguir o que dizes querer?
O que te dá o direito de querer?
Querer é um direito?
É um dever tentar alcançar o que se quer?
Quanto é querer muito?
Quanto é querer pouco?
Querer muito é ser demasiado ambicioso?
Querer pouco é não ter ambição?
Querer assim assim é ser mediocre?
Querer tem alguma relação com ser?

Gosto.
Gostas?
O que é gostar?
Que importância tem gostar?
Como se mede o gostar?
Deve o gostar ser medido para se avaliar aquele gosto?
Porque gostas de algo?
Porque não gostas?
Quanto tempo dura um gosto.
Gostasse mais se se gostar mais tempo?
Gostasse mais consoante o que se está disposto a sacrificar pelo que se gosta?
Gostar muito é perigoso?
Gostar pouco é ser indiferente?
Gostar demasiado é dispersão?

Acredito.
O que é acreditar.
Qual a diferença entre acreditar e ter fé?
Devemos acreditar ou devemos duvidar?
Se não acreditarmos em nada falta-nos alicerces?
Se acreditarmos em algo que não devemos corremos o risco de construir sobre maus alicerces?
É importante acreditar?
O que nos faz acreditar?
O que nos faz não acreditar?
Até onde deve ir a nossa luta pelo que acreditamos?
Se surgir uma leve sombra de dúvida na nossa crença, devemos manter a luta?
Não acreditar em nada pode levar à passividade perante a vida e o mundo?


Eu faço.
Faço porquê?
O que me move?
Onde quero chegar?
Sei o que faço?
Faço o que faço com consciência de o fazer?
Faço realmente aquilo que digo fazer?
Que significado tem o que faço?
Que importância tem o que faço?
Que ganho ou perco com o que faço?
Qual o alcance do que faço.
Existe razão para o fazer?
Que fiz eu até hoje?
Que quero eu fazer no futuro?


Eu penso.
Pensas mesmo?
O que é pensar?
O que pensas?
Se pensares mais, e mais e mais, continuas a pensar o mesmo?
Amanhã é igual o teu pensamento?
Para que serve o pensamento?
Qual o valor de um pensamento em constante mudança.
Em que interfere o teu pensamento com o pensamento dos outros?
Em que interfere o pensamento dos outros com o teu?
Que valor tem o teu pensamento no mundo.
Que faz mudar o teu pensamento.
E o teu pensamento muda alguma coisa?
Como defendes o que pensas?
Se pensar te fizer infeliz deves parar de pensar?
É possível parar de pensar?

Não!
Não respondo hoje eu! Sem absoluta certeza!
O pensamento é como a vida, como o tempo: redondo.
O pensamento rebola redondo, noutros pensamentos igualmente redondos.
Todo o pensamento é redondo, não existe pensamento de qualquer outra forma, não há pensamento quadrado, ou triangular, por exemplo.
O pensamento só o é quando redondo.
Circular é a única forma que o pensamento pode tomar.
Por ser redondo é capaz de rebolar sempre sem nunca parar.
Por ser circular circula e continua circulando sempre sem nunca parar.

Como a vida, o tempo, o tempo, o tempo
Como a palavra, as palavras, as palavras, as palavras
Como o pensamento, redondo, redondo, redondo

rebolando pelo mundo

sem parar

sempre redondo


Obrigada Pai por me teres feito duvidar de tudo mas estares sempre lá para amparar as minhas dúvidas.

Obrigada à Maria e à Vida que partilham comigo estes e outros pensamentos que faço rebolar neste espaço.
É bom saber que existe alguém desse lado, que não vê quando me rasgo para escrever, mas recebe este fruto duro, cru, amargo e doce que no fundo sou eu feita e desfeita em palavras.

Muito obrigada.

Isabel
Anjos e Demónios
Fotografia de Helena Isabel Ponce